julho 25, 2007

A roleta russa dos céus brasileiros

O Brasil acaba de quebrar mais dois recordes, desta vez nada abonatórios, como as infindáveis medalhas de ouro que tem vindo a arrecadar nos Jogos Pan-Americanos, mas aterradores: o de ter tido dois desastres aéreos em menos de dez meses – o choque em pleno ar entre um avião da GOL e um jacto particular em Outubro passado na Amazónia, e o facto de o último, a queda na passada semana, em São Paulo, de um avião de passageiros da TAM em que morreram 199 pessoas, ter sido o maior de sempre na América Latina.

Para somar ao facto de ficarmos todos a saber em Outubro passado que há dezenas de “zonas cegas” nos céus brasileiros, não cobertas pelos radares e, portanto, não controladas por ninguém – onde os pilotos voam apenas com base naquele instrumento de precisão, de fiabilidade bem conhecida e very typical por estas bandas, conhecido por “olhómetro”... –, e de ter vindo a público a incrivelmente sobrecarregada carga de trabalho da inversamente proporcional quantidade de controladores aéreos nos aeroportos do país (calcula-se que seriam necessários mais 70% no activo, sem contar com os de reserva, só para atender ao número de vôos médio actual), ocorre-me comparar a aventura de voar no Brasil – destino que, como se sabe, recebe quase 90% dos portugueses em férias no exterior – a um jogo de azar, o qual, como a roleta russa, poderá facilmente resultar na morte dos participantes.

Para além do perigo de vida, soa-me a futilidade falar do desconforto e do abandono total dos passageiros acampados nos aeroportos de São Paulo e do Rio: só nos últimos dias, por causa das chuvas intensas (mas habituais), do aumento exponencial do tráfego aéreo resultante das férias escolares e do Pan, estão cerca de 15 mil pessoas em longas filas de espera a ver 70% dos seus vôos cancelados e atrasados, sem previsão para decolar, sem acomodação, assistência ou alimentos assegurados pelas companhias aéreas – obrigatórios segundo as regras internacionais – e, para cúmulo, sem qualquer explicação ou pedido de desculpas por parte das autoridades competentes.

O caos aéreo brasileiro já é há meses motivo de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) e, segundo a Globo, acabou por causar (hoje) a substituição complusiva do Ministro da Defesa, além de várias denúncias de sobrefacturação que explicariam os mais dois anos de atraso nas obras dos das pistas dos aeroportos de São Paulo, cujo dinheiro reverteu para campanhas eleitorais. Também hoje foi finalmente proibida pelo Ministério da Defesa a venda de passagens para vôos com origem no maior aeroporto de São Paulo, Congonhas, até serem escoados todos os passageiros não embarcados até agora – medida que, segundo a mesma fonte, acabaria com o problema em 24 horas; mas, na mesma notícia, é afirmado que a venda de passagens continua a decorrer normalmente, com uma taxa opcional de 20% para quem quiser ter a certeza que decola... – mais uma promessa por cumprir.

Até ontem, o Brasil tinha-se esquivado às implicações internacionais do problema dando prioridade absoluta aos vôos externos, mas hoje, um vôo da British Airways com destino a São Paulo foi obrigado a aterrar no Rio, e os seus passageiros e respectiva tripulação estiveram catorze horas aprisionados dentro do avião estacionado, sem autorização para sair, sem comida e, como é óbvio, sem qualquer explicação. Se não conseguem estatelá-los no chão, matam-nos à fome?

3 comentários:

ana v. disse...

vou levar isto para a porta do vento.
ana

ana v. disse...

É puro humor negro, do mais cáustico que pode haver, pensar num avião que entra por outro dentro e se chama GOL. Mas é inevitável.

Mad disse...

E este era da TAM... e também dá para fazer humor negro. É caso para pensar se eles não deveriam seriamente pensar em mudar os nomes das cias aéreas!