julho 13, 2007

O "meu" Baleal

fotografia da Carmo Formosinho (tirada daqui)

Pegando numa frase que pelos vistos anda a irritar muita gente há décadas (e eu que pensava que era só a mim), "o Baleal é nosso", repetida no hino até á náusea, proponho substituí-la por: o Baleal é meu. Meu. Como é de todos e de cada um a que vem à memória as aventuras engraçadas, carinhosas, brejeiras, amorosas, perigosas, proibidas, gastronómicas, alcoólicas – e mais uma dezena de adjectivos que não me vêm à cabeça agora – que lá protagonizou.

Como a todos os que lá vão desde a infância, os verões no Baleal marcaram-me a alma para sempre. A começar porque tinha que explicar muito bem às minhas amigas da escola porque levava para lá a roupa de inverno, que incluía samarras, camisolas de lã grossa e cobertores de papa, que naquele tempo ainda não havia edredons, e fazê-las acreditar que, mesmo com aquele frio desgraçado, aquilo ainda era – de longe! – o melhor sítio do mundo para passar as férias, uma espécie de reino encantado onde eu tinha dois milhões de amigos, andava sempre em bando e à solta o dia inteiro e só ia a casa para comer (quando não comia na casa mais próxima) e dormir, e onde tinha ordem para me deitar (pasme-se!) às 11 da noite, depois de vir do clube, um sítio que tinha bar e pista de dança e tudo.

Claro que eu passava o inverno inteiro a falar do clube, das brincadeiras, dos amigos, das olimpíadas, das idas ao mexilhão e aos camarões, dos passeios às Pedras Muitas, dos jogos de vólei na praia, dos passeios de barco nos dias de mar de chão, das experiências no surf que abandonei rapidamente por absoluta falta de jeito, etc. Nessa altura, a minha vida dividia-se em dois períodos bem distintos: os meses em que estava no Baleal e o intervalo em que sonhava em ir para lá outra vez.

Depois veio a fase, não menos importante, do primeiro namoro e o primeiro beijo (aos 11!), e mais tarde a primeira paixão adolescente, que ainda durou uns anitos, completamente platónica e não correspondida, mas de caixão à cova. Foi a altura das festas do clube, das saídas para o Greenhill e para as festas de Ferrel, as primeiras bezanas e os consequentes cantos gregorianos, as jantaradas na Foz ou em Peniche em grupos de 50 pessoas, as idas raras à concorrência (S. Martinho), as mais frequentes ao Voilá... E ainda mais tarde a primeira paixão de adulta, não tão platónica e muito mais correspondida... e um milhão de outras histórias interessantes que ainda hei-de escrever (nas minhas memórias, entenda-se, não aqui).

Depois, como muita gente, cansei-me da pequenez da ilha, dos eternos mexericos, dos horizontes percorridos vezes demais, e rumei para outros portos. Chegou uma altura em que a ilha me sufocava e, apesar de morrer de saudades dela, já não aguentava as tacanhices de sempre.

Nunca deixei de lá ir, sempre no inverno, a minha altura preferida de sempre. É nessa altura que tenho a ilha só para mim e que percebo que as raras pessoas conhecidas que encontro lá (o Tomaz é uma delas) a vêem como eu a vejo. Deserta, linda, gelada, iluminada, encantadora, húmida, ventosa, chuvosa, silenciosa de gente e gritante de gaivotas, cheia de mar, de areia e das rochas que ainda conheço de cor, em toda a sua glória.

O Baleal é meu – mas o Baleal de inverno.

10 comentários:

Maria Feliz disse...

Miga,

De tudo o que descreves, só conheço o Greenhill. Sei que não abona muito a meu favor, mas ao menos conheço JERI.

E ando numa de percorrer a costa portuguesa, com um guia à maneira:)
Pode ser que passe a conhecer o teu baleal.

Beijos

Mad disse...

Vai. E pede-lhe qe te leve às Berlengas, à Almagreira, ao Bom Sucesso, a Óbidos, aos Supertubos, à Areia Branca...

João Paulo Cardoso disse...

Parem de me fazer inveja!!

Adoro vijar, mas não tenho tido po$$ibilidade$ para isso!!

Ann... para esses lados da Costa Oeste conheço Óbidos, Peniche e Foz do Arelho.
E pronto.
Chuif...

(realmente a Flora tem razão. Ando muito queixinhas. E eu até sei porquê...)

Maria Feliz disse...

JP,

Que foi, nino? Vá, desabafa lá com as amigas. Qué passa?

Mad,
Mais uns comentáriosdestes e isto vira um perfeito consultório sentimental. Queres pensar nisso? Colocamos anúncios do Adsense e ainda ganhamos usn trocos... a meias, bute?;-)

Jokas

PS: JP toca a levantar esse moral. Vai uma caracolada na Lagoinha?

Mad disse...

Agora fazem-me inveja a mim!
Flora, hoje em dia topo (quase) tudo o que possa dar dinheiro.

Anónimo disse...

Em primeiro lugar, um abraço do lado de cá do Atlântico.
No fundo, basta sair do Baleal e seguir sempre em frente, depois de virar nas Berlengas à esquerda. Fácil.
Para vir de aí para cá, é só tomar a corrente do golfo, expressa em www.arre-burro.weblog.com.pt
A Madalena tornou-se em mais uma das participantes, para lá da sua posiçõa, já estabelecida, de comentarista.
Assim se faz a cooperação luso-brasileira (ou brasileiro-lusa).
Abraços e, agora que aqui poisei, vou continuar porque gostei!
Mário Cordeiro
PS: único problema para resolver: a transferência do Ronaldinho Gaúcho para o Benfica!

ana v. disse...

vou pegar no tema e falar também no "meu baleal", há que tempos que ando para fazer isso.

Mad disse...

Bem-vindo, Mário!
Obrigado pelos comentários e apareça quando quiser aqui neste humilde "brogue"!
Quanto ao Benfica, você acabou de dizer a única palavra que eu conheço em futebolês. Mas, quem sabe, pode ser que o Ronaldinho se convença.

Anónimo disse...

Passei por aqui por mero acaso (vindo dos Açores), mas identifico-me com grande parte deste texto.
Embora, o Baleal seja sempre um local que vou todos os anos - 2 ou 3 dias, os meses de verão que lá passei durante a infância nunca serão esquecidos.
A liberdade do Baleal era única!
Parabéns pelo blog.

Mad disse...

Caro anónimo, bem-vindo também. Mas para a próxima vez assine, para eu poder retribuir a visita. PS - Será que nos conhecemos do Baleal?